quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Diferença



Esquece, esquece, esquece... esquece a ventania que descabela as árvores...

Esquece mais uma vez... esquece a tristeza extrema que circula impunemente entre os cachos de uvas descontentes com a invasão das vozes sorrateiras...

As portas estão trancadas mas as vozes vêm pela janela semi-aberta ou pela sala distante habitada pela ventania que se comunica aos gritos – gritos ignorados no quarto trancado...

Nada mais é absorvido – a devolução sem digestão... pedaços inteiros de tristeza extrema não mastigada devolvidos na privada...

Se fosse possível virar tudo do avesso e recomeçar sem nenhum tipo de lembrança – esquece, esquece, esquece...

Esqueça tudo e qualquer coisa – simplesmente esqueça...

Esqueça quem você é ou foi ou será – e esqueça o que quer também...

Já que nada é como queremos – então que nunca mais se deseje nada...

Que a vida seja um eterno tanto faz – porque nada mais faz diferença...

Liz Christine

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Sócrates e Greta Garbo



O vazio das mentes opacas – era uma vez uma pobre vaca velha (...). Sócrates, o gato mais inteligente e charmoso do universo, sabe que todos os bichinhos são dignos de respeito – mas a pobre vaca velha nunca respeitou nenhum bichinho que cruzou seu caminho. A vaca velha era pobre de espírito, pobre de coração, pobre de sentimentos, pobre de poesia, pobre na compreensão do mundo e da arte. A pobre vaca velha nunca foi capaz de compreender um único filme mesmo tendo desconto no cinema para a terceira idade. Ela vai ao cinema com frequência pois vive confortavelmente de pensão deixada pelo finado boi. O pobre finado boi foi uma das vítimas da vaca velha – o boi foi pobre pela incompreensão dos que o rodeavam, foi pobre porque sofreu a vida inteira, foi pobre porque era um coitado digno de pena, foi pobre porque nunca o deixaram exercer todo o seu potencial, sempre sufocado pela vaca velha (vaca pobre em outro sentido). E o casal teve um pequeno boizinho gordo e nanico como ele só. O pequeno boizinho não vai entrar na história – nem a vaca louca que é a tia solteirona e sem rebentos do boizinho obeso. Uma família corrompida pela ganância e pobreza de valores da repugnante vaca velha que maltrata todos os bichinhos das redondezas. E Sócrates, o gato mais inteligente e charmoso do mundo (repito), teve a chance de observar essa vaca medonha de perto. Era uma vaca com veneno de cobra, uma mutação genética que escondia o próprio veneno só até se sentir contrariada. Ela se pudesse mandaria em tudo e em todos – mas há um forte movimento no spa dos bichanos felizes anti-vaca-velha. Sócrates, como já foi dito, sabe muito bem que todos os bichinhos merecem o devido respeito – e sabe também que há boas vacas cultas e inteligentes, bem-educadas, gentis, harmoniosas e de bom coração. Mas o movimento do spa dos bichanos felizes visa apenas combater o veneno específico da vaca velha que é incapaz de compreender qualquer coisa que não diga respeito à vida medíocre dela. Abstração é algo que não existe no vocabulário desta vaca. Nem compreensão, nem respeito ao próximo. E nem ao menos a palavra privacidade existe no dicionário desta vaca pois ela invade o espaço de tudo e de todos o máximo que pode. Sócrates, o gato mais doce do mundo, está neste exato momento tentando salvar Greta Garbo das garras venenosas da medonha vaca velha gananciosa. Greta Garbo é uma gata branca com manchas pretas que teve apenas três namoradas – gatas como ela – e jamais se casou ou namorou gatos machos. É uma jovem gata adulta porém inexperiente em certos aspectos – e Sócrates mantém um caso de amor platônico com Greta Garbo. E a vaca velha, extremamente retrógrada apesar de se achar muito moderna (ela não se enxerga como realmente é, a pobre vaca), anda espalhando fofocas e veneno por toda a cidade na tentativa gratuitamente maldosa de destruir a reputação da tímida Greta Garbo (uma gata muito introspectiva e totalmente na dela). Será que Sócrates consegue salvar Greta Garbo do veneno da vaca pobre de espírito? O melhor amigo de Sócrates é um labrador muito simpático que divide apartamento com uma raposa que faz análise com um papagaio. O papagaio é um grande psicanalista renomado e Sócrates está interessado em uma consulta inicial para expor o problema. Será que Sócrates consegue expor seu grande amor platônico e confessar toda a sua imaginação em uma sessão? E como termina esta história? A vaca velha vai destilar veneno até quando? E o amor impossível de Sócrates, como fica? Sócrates é um anjo encarnado em forma de gato, disto tenho absoluta certeza. É a certeza mais óbvia de uma história sem ponto final...,,,,,,

Liz Christine

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Sem nenhuma conclusão



O rato não lava o pé, o rato não lava o pé – enquanto o sapo injustiçado toma um banho na lagoa dos patos para depois encontrar a borboleta enfeitiçada e oferecer um doce presente a ela. O sapo injustiçado guardou uma caixa de macarons para oferecer à borboleta enfeitiçada que não consegue mais sair do lugar ou voar para outros lados devido ao vodu maledicente do rato que não lava o pé nem as mãos imundas. Os hamsters e chinchilas tentam quebrar o vodu maledicente do rato mau que rouba sorrateiramente toda a comida da geladeira e do restaurante vizinho e também, além disso, o rato mau e sujo rouba todas as palavras gentis das redondezas – restando apenas a maledicência macumbada que sufoca a pobre borboleta. Ela é rica em invencionices e criatividade mas pobre de forças para se libertar do rato imundo que a persegue roubando seus iogurtes e presentes e palavras ou poemas. Ela não tem privacidade alguma, tudo é vigiado e registrado para ser usado na manipulação macumbada dos alfinetes do vodu. As únicas alegrias da borboleta agora sem rumo são o seu grande amigo sapo cheiroso e a namorada dela que se chama Luana e é apelidada carinhosamente de Lua. Tudo que a borboleta quer é liberdade, poesia, prazeres positivos que não prejudicam ninguém, e um pouco de privacidade – isso é demais? Isso infelizmente soa impossível com um rato mau e imundo, além de persecutório e manipulador, que às vezes tenta até impedi-la de ver sua namorada ou encontrar seus amiguinhos e vizinhos. O rato imundo trafica queijos ilegais ou roubados e assim faz sua fortuna que ele emprega para controlar tudo e todos que moram na reserva florestal das águas límpidas. Tudo é limpo e belo na reserva – apenas o rato emporcalha os habitantes com seu fedor e maldades. Nada tem solução por enquanto – por isso a história da doce borboleta lésbica termina com um sonho de liberdade reconfortante e acaba sem nenhuma conclusão (...).

Liz Christine

Suicídio refletido no espelho


Suicídio refletido no espelho – morte de todas as ilusões. Jogo sem conclusões – equações que se repetem indefinidamente. Palavras sem nexo – sentidos sem pouso. Eterna solidão – regras sociais. Fora dos padrões socialmente aceitos – a hipocrisia. Sorria, você está sendo filmado. Finja, você está sendo observado. Disfarce, você está sendo hipnotizado. Esconda todas as obsessões, você está sendo analisado. Pratique o desapego, os meses passam rapidamente. Viva cada segundo – desde que a costumeira vigilância severa vá sugar outras vítimas. Vítimas de uma sociedade doente e agonizante – promessas de futuro incerto. Promessas falsas, promessas frágeis – um futuro que nunca chega. Suicídio refletido no espelho – morte de todas as ilusões. Um sonho de liberdade passageira – o suicídio de todas as liberdades individuais. Não, não, não sei – não há tempo para escolhas ou recusas. O tempo decide por todos nós – suicídio de todas as liberdades. O governo decide o que proibir e o que liberar – a sua opinião não fará diferença alguma. Ninguém nos pergunta absolutamente nada – as autoridades sabem melhor do que nós o que nos faria mal ou bem. Nossa opinião ou manifestações não contam – as autoridades ou pesquisadores patrocionados entendem tudo bem melhor que todos nós. Não compreendemos absolutamente nada, ou entendemos muito pouco dos assuntos – não somos mais capazes de decidir por nós mesmos. Não é mais permitido ter opinião ou comentar – acabou. Acabou tudo. Acabou até a paixão. Acabou até o prazer. Acabou até o livre arbítrio. Acabou a sanidade mental. Acabou a poesia. Acabou a arte. Só importam as pesquisas de mercado e o possível lucro. As minorias são hipocritamente aturadas – mas não têm voz alguma no caldeirão das Eríneas. Suicídio refletido no espelho – a morte da poesia. A beleza é uma ilusão – a beleza dos valores, a beleza dos sons ou sombras. Sombras da realidade destruída – a destruição das palavras. Palavras deturpadas, retiradas do contexto original – a manipulação através da degradação. Degradação dos ideais ou objetivos – o sufocamente das vontades ou sonhos. Acabou. Acabou a música. Acabou a literatura. Acabou o teatro. Acabou a cultura. Acabou o balé. Acabou o pas de chat. Acabou o amor. Acabou a segurança. Acabou a auto-estima. Acabou tudo. Só restam sombras. Suicídio dos sonhos soterrados por uma realidade que só apodrece a cada mês – e os meses passam rapidamente. Os meses passam e nada permanece – não resta mais nada a não ser fazer silêncio.

Liz Christine