segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Primeira febre amorosa


Derramo lágrimas por todos os poros do meu corpo e elas se fundem num rio de incompreensão que atordoa qualquer boa-vontade minha em relação ao. O futuro soa como gelo se derretendo em minhas costas enquanto mãos doces massageiam meus ombros num lugar cheio de fumaça que resseca os olhos que se fecham para te ouvir melhor. Tuas frases curtas e complexas como a simplicidade do primeiro amor correspondido – e portanto real – grudam no meu pescoço sensível a teus beijos. Eu acredito plenamente em ti e te confio minhas idéias – mas não hoje. Hoje quero te sentir sem raciocínio algum – apenas te sentir – e minhas lágrimas são imagens de sentidos ampliados que desenham meu prazer. Talvez eu chore quarta-feira. Mas hoje não, aqui não, contigo não, agora são apenas lágrimas feitas de brigadeiro – devem deslizar pela garganta, engolidas por tua impaciência de querer a extremidade. Eu nunca imagino que isso tudo tão verdadeiro possa desaparecer um dia – porque confio no teu amor. Eu aprendi desde a infância que todos traem e que muitos abandonam – mas tu não é todos nem muitos, tu é única e me fascinam tuas características próprias. Então eu te confio tudo que existe em mim e que não permanece escondido de mim mesma – dos meus esconderijos eu não tenho controle nem consciência, mas se tu consegue mergulhar neles e decifrá-los pode ir em frente também. O amor também é feito de prazeres físicos – mas nisso eu já me entreguei a ti mesmo antes de te amar assim. Desde o início. Eu não espero. Não espero que antes dos prazeres venha a confiança, pois confiança também se faz de prazeres compartilhados. E códigos nascem da confiança. Para ser franca, qualquer coisa em ti me deixou a impressão – antes mesmo de eu te conhecer cada vez mais – que tu era completamente diferente de tudo que eu já havia... desde o primeiro beijo, eu senti... e só se aprofundou... em todas as noites que passamos juntas. Espero que tu saiba o que fez comigo, pois eu já tentei fugir de ti algumas vezes – e tu me buscou de volta e me conquista mais a cada dia ou noite. E agora eu te amo mas não espere ouvir essa frase de mim – já temos um código para esta frase, e eu o digo sempre que tu quer ou que eu quero...

Liz Christine

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Borboleta verde


A borboleta verde voa em direção ao meu seio esquerdo. E suga minha consciência. E quero apagá- la de minhas perdas insuperáveis – quero que dela se façam apenas prazerosas reflexões e memória deliciosa de lembrar. Não deve ser considerada uma perda – mas a melhor parte de minha vida. E que seja breve. Não vou prolongar esse momento. Ouço Billie Holiday e Nina Simone – especialmente “The moon looks down and laughs” e “I wish I knew how it would feel to be free”. Também escuto “Smoke gets in your eyes” cantada por Dinah Washington. Penso na borboleta verde que me teve – e não mais no que perdi ao perdê-la. Ela me teve sem perceber. Pensava que era minha e eu a renegava mas eu era dela e também a sugava. Como se nossa essência fosse pólen, uma para a outra... em três breves anos de convivência.

Liz Christine

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Grito


“Uma mulher com asas precisaria de um amante que as tivesse ou pelo menos não sentisse medo ao perceber as dela. Ou seres com asas são necesseriamente solitários? Pois um amante, ainda que também tenha asas, pode querer fugir de tais enredamentos, asas com asas, vôos entrecruzados, queda no abismo, o risco.
Podia – mesmo sendo meio-anjo também – preferir uma mulher mais rasa e mais apaziguadora.
Anjos e fantasias estão desde sempre exilados de si nesse terror das possibilidades, dos deslimites.” (Histórias do tempo, Lya Luft)

Estrelas dançando nos olhos dela. A lua mora no bolso da minha saia vermelha. E eu beijo o rio prateado que corre nos lábios dela. A vida é assim, um rio prateado que circula dentro de nós e nos percorre dos pés aos lábios. Meu rio anda inquieto. Quer transbordar e se fundir ao rio dela. Ela beija minhas pálpebras fechadas e sussurra palavras ao meu ouvido. Sim, meu amor, estamos com sede, sede de rios translúcidos e transbordantes que se fundem num grito de prazer.

Liz Christine

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Nebulosas

Uma vozinha fraca chega através da janela. As paredes são de papelão. Minha cama é uma caixinha de música encontrada num antiquário e dada de presente. Eu ganhei uma rosa branca. As transparências. Todo sonho tem as suas transparências nebulosas.

“Sacudo a dor como se tira dos ombros o vestido que gruda no corpo. Se pudesse sair assim do casulo.” As parceiras, Lya Luft

A gata dorme na janela. Janela com tela do sétimo andar. Olho a gata, não estou pensando em nada. Simplesmente não consigo pensar. Que não voltaria mais a essa casa, é o que eu achava. Achava também que não ia mais dormir sem lexotan.

“Fecho os olhos: quando vou conseguir fechar assim o coração? Me encerrar em mim, como outros nas aparências, na loucura?” As parceiras, Lya Luft

Lexotan. Um e meio. Mais um quarto. Todo sonho tem suas transparências nebulosas. Toda vozinha fraca tem sua raiz nas asas das paredes de papelão. Todas as paredes nessa rua são de papelão. E as nuvens são amarelas. Amarelas e sorridentes.

Mas meu pesadelo é laranja...não laranja como foi a cor do meu cabelo um dia, ou laranja como é o pêlo de gatinhas vira-latas andando por aí no meio de outros gatos de outras cores... mas sim, meus pesadelos são da cor de uma abóbora apodrecida e descartada de qualquer receita...

Liz Christine