quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Azul


É, o mar azul – o mar azul invade minhas mãos quando eu me vejo tocando minha abstração mais suave. E meus pulmões estão repletos da tua voz – que eu absorvo tragando visões. Eu te vejo. Eu te vejo em caixinhas de música com bailarinas rodopiando solitárias. É que quando penso em ti a solidão é inerente – apenas eu concordo. Apenas eu concordo que não tive nenhuma culpa – porque para mim não há culpados nunca. Há limitações às vezes – ser uma folha em branco tem suas limitações. Eu era uma folha em branco. Mas fui preenchida. E ser preenchida também pode atrair limitações – mas tudo depende. Tudo depende de todos – mesmo que busquemos a auto-suficiência.

Liz Christine

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Like a long forgotten dream


Uma música sem rosto. Para descansar um pouco do teu olhar. É que não vejo ou sinto em todas as músicas. Sim, quero escutar algo que eu desconheça e possa me ajudar a não pensar em ou pressentir algo que desejo mais do que. Algo que se desenha na massagem que eu parei antes que. Eu senti teus ombros e minhas mãos começaram a doer por vontade de – e me interrompi porque eu. Minhas mãos poderiam ter deslizado e eu não queria nada porque não conseguia ler o que eu gostaria de saber nas tuas frases. Parece que tu não gosta quando fico em silêncio ou quieta. Mas é que eu preciso. Eu sou também silêncios. Um silêncio feito de transparências. Até que falo demais – e depois descanso de mim mesma porque vivo mergulhada em idéias e sonhos dos quais tento escapar de tempos em tempos – então eu prefiro me esquecer de mim e te ouvir. É simples. Eu preciso que tu me conheça em alguns trechos e me desconheça em algumas partes – e seria agradável se tu desejasse o conhecido e o desconhecido. Onde houveram mudanças – como seríamos? Onde eu nunca soube – como seria agora que descubro? Alguns anos sem te ver – e algum dia após te reencontrar eu vim à tona de outra forma. Quero dizer, eu me senti assim dessa forma: nada era previsível como antes (quando eu não te via mais) e eu – eu me espantava diante de tanta. Parece que antes eu era muito velha e nada mais me despertava curiosidade – como se eu houvesse perdido a sede. As novidades, qualquer uma delas, me pareciam velhas conhecidas e nada me surpreendia. Até eu vir à tona de novo com toda a sede que eu carrego dentro de mim quando estou diante de uma realidade na qual quero (me) descobrir. As músicas desenham cada qual um rosto ou lembrança – e muitas delas redesenhavam teus olhos ou uma voz ou qualquer outra coisa que esqueci. Porque é muito fácil esquecer – quando não é essencial. E se meu equilíbrio dependesse em parte de uma lembrança parcialmente apagada por uso abusivo de não importa o quê – por mais que eu tentasse não há como lembrar. Mas da nossa convivência eu tenho imagens vivas dentro de mim. Muitas noites e dias juntas, tudo vívido – mas seria melhor deixar de lado e realmente começar do início. Um início novo e autêntico. Não sei. Eu guardo lembranças tão boas de ti que é difícil me desfazer delas – mas eu posso te ver ainda como alguém que devo conhecer (e não como alguém que já conheço bastante). Sabe por quê? Talvez porque nunca seja o bastante. Ou talvez porque pode-se mergulhar cada vez mais fundo. Ou talvez porque seja natural aceitar e procurar as mudanças que todos nós sofremos ou buscamos.

“Can’t you see
What love and romance have done to me
I’m not the same as I used to be”
My last affair, Billie Holiday

Liz Christine

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Asas de.


“And I ain’t guilty of crimes accused me of,
But I’m guilty of fear.”
It could be sweet, Portishead

Fecho os olhos. Tua voz flutua em torno da minha nuca – onde começa o meu. Minha intenção é mergulhar nos teus olhos – verdes como as asas de uma. Sinto as cores. Cores se multiplicando em minha nuca num contínuo que se estende pelos ombros e escorrega através de meus braços até chegar em minhas mãos – eu quero. Preciso tocar tua pele. Teu rosto de frente para mim – mas onde eu te sinto é em minha nuca. Quando meu olhar se perde dentro das minhas intenções – é como se eu os fechasse para ouvir tua música. Porque tuas frases parecem saídas de um poema musicado – e feito exclusivamente para mim, apenas eu poderia mergulhar dentro desse poema. Sei que quando tento dizer a qualquer pessoa o quanto eu – não posso dizer. Não há como explicar uma vontade irracional ou um prazer físico causado por um simples olhar – mas nada é simples, ou nada é complicado como pode parecer. Não posso nesse instante ler teu verde. Não compreendo tuas perguntas e não adivinho tuas motivações – é que minhas pernas concentram toda a minha atenção. E sei que querem correr – ultrapassar todas as etapas. Etapas estipuladas por quem? Talvez não passe mesmo disso. Talvez não haja nenhuma vontade em ti de me ter mais uma vez. Já me teve e talvez já tenha sofrido por motivos que esqueci ou nunca soube ou não quero ver. A inconstância de meus pensamentos gira em torno de possibilidades utilizáveis de te esquecer rapidamente... ao chegar em casa vou tentar – e claro que consigo – pensar em outro rosto que não o teu. Vou fabricar pensamentos que me impeçam de querer te ligar para saber se chegou bem em casa. Pouco me importa. Os meios de superar não importam, o que conta é superar. Antes – eu queria mergulhar, tentar, te respirar, te ver. Agora – não sei.

Eu quero a realidade do encontro de intenções que convergem na mesma direção. Não preciso de mais fantasias – devo me despir delas – porque apenas sonhar não me leva. Preciso ser levada. Até os limites de mim mesma para esquecer o quanto tenho medo. Medo de perceber que ainda te quero.

Liz Christine

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Sei mas não sei


“Never enough,
Render your heart to me.”
(música All mine, Portishead)

Sei que fumo demais e sei que como de menos. Sei que não sou mais tão silenciosa quanto costumava ser. Mastigo palavras – todas elas – mas não são tantas. Leio mais do que ouço, eu sei. Sonho mais do que escrevo e sei que escrevo mais do que consigo dizer. Sei que pouco importa quantas vezes te imaginei cruzando meus caminhos, a realidade sabe como ultrapassar minha imaginação. É que te imaginava outra pessoa, uma pessoa menos linda, menos atraente no presente do que foi no passado – apenas te imaginava menos para te esquecer mais. Sabe que eu te imaginava menos imprevisível? É que quanto menos posso prever mais eu perco o auto-controle. Não que eu perca tempo prevendo ou raciocinando o comportamento de pessoas – é que a maioria das pessoas pode-se ler displicentemente e de má vontade. Curiosidade é para mim uma palavra frívola que não abrange uma vontade real – eu tinha necessidade de te rever um dia, o quanto antes se fosse possível, curisiodade eu não tinha nenhuma. Curiosidade é para o que desconheço ou conheço muito pouco – coisas que funcionam como... algo sem tanta importância que não faz parte de mim – mas já quis provar de tudo um pouco. Antes. Antes de te conhecer. Antes de te perder. Antes de conviver contigo. Antes de sofrer a tua ausência. Antes de toda a ansiedade de saber que o quê se tinha era talvez a mais importante de todas as minhas... a melhor das fantasias que um dia se tornou real. E se foi. É fácil negar. É muito fácil dizer – “não foi nada”... É fácil bloquear um trauma na memória e é fácil negar um amor – mas são coisas diferentes. De qualquer forma, eu vivia na negação. Negava que curiosidades sem profundidade e sem desejo real de – bem, curiosidades talvez teóricas que não faziam parte da minha realidade sensorial – eu as negava e apagava de minha memória. Mas também negava os prazeres do amor real – aquilo ao qual eu realmente me inclinava. Era fácil me entregar a ti totalmente – mas também era fácil não dizer que te amava. Mas agora olhando teus olhos, o difícil – mas não impossível – é não deitar no teu ombro. Qualquer tipo de contato físico, sabe? Segurar tuas mãos, deitar no teu ombro, chegar mais perto – mas como disse, difícil mas não impossível. Também não é impossível que eu não te ligue no dia seguinte – sou uma menina muito... nada controlada, muito menos controlável, mas muito... fiel a mim mesma. Não ria da palavra fidelidade, sei que soa estranha em mim. Se um dia você ler o que escrevo, saberá – ou não? – que estou falando de ti. E talvez tu entenda o que provavelmente sempre soube a meu respeito – minhas verdades são fáceis de ler. Sonho muito mais do que escrevo e escrevo mais do que falo – mas sei também que olhos falam, rosto fala, pele fala, mãos falam, vestidos falam, sapatos falam, unhas falam. E a tua mania de dizer que tudo parece um filme – isso eu também não previa escutar mais uma vez. Para mim nem tudo parece um filme – algumas coisas sim. Há quem me faça sentir como num filme e há quem seja música para mim ou um livro daqueles que quanto mais eu leio mais eu...

Mais eu leio, mais eu vejo, mais eu ouço, mais eu mastigo, mais eu te quero...

Liz Christine

Inesperado

Muito antes a vida me fascinava – e eu vivia brincando com extremos. Talvez eu tentasse. Agora a vida deixou de me fascinar – e agora sinto medo. Um medo que antes eu não tinha. Eu pensava que quem amava demais fazia exigências – e agora vejo que muitas pessoas exigem demais, e sem um pingo de amor. Exigem que a gente sorria o tempo todo – não podemos fechar as cortinas ou o rosto nunca. Exigem que a gente nunca fique em silêncio – não se pode ficar nem contemplativa nem pensativa. E exigem que encaremos sonhos como sonhos apenas – nada mais que sonhos sonhados que devem ser deixados de lado diante de uma realidade esmagadora. Tenho colecionado decepções. Talvez eu espere demais – mas na verdade não espero nada idealizado. Eu espero o inesperado. Apenas o inesperado – e as tragédias me parecem convidadas. Todas elas aceitam o convite e me visitam – eu as convido mas sempre acho que não vão aparecer. Já me defini como uma tragédia que busca prazeres. Mas qualquer definição é limitada por definição. Tudo deve ser mais abrangente. Mais abstrato. Menos limitado. Menos definido. Mais inesperado. Menos previsível. Não espero nada mais – e nada mesmo acontece. Antes, muito antes, eu também não esperava muito – mas os sonhos sonhados por mim chegavam sem convite prévio. Talvez eu fosse até mais confusa, e mais suicida – apesar de ter sido fascinada pela vida, eu fui suicida, simultâneamente. Agora tenho medo de muitas coisas, inclusive da morte – e engraçado: a vida não me fascina mais como antes. Alguns dias atrás, eu podia ter dito que nasci de novo – eu estava ouvindo música e me senti tão nova diante de tudo (sobretudo diante de um rosto amado por mim que eu já conhecia da minha vida anterior), então me enrosquei toda e abracei minhas pernas, deitada de lado. A música era muito macia e muito inédita para mim – e o rosto que eu conhecia da minha vida anterior (aquela vida na qual tanta coisa me fascinava) estava tão próximo de mim... sem estar comigo realmente. Mas hoje já me sinto outra. Em tão pouco tempo, já me sinto cansada de exigências. Não é difícil que as pessoas olhem para mim. Mas é realmente muito difícil que não pensem que sou como uma espécie de massinha de modelar – não, eu não sou. Procurem outras massinhas de modelar. Eu posso me transformar – por mim mesma, quando for necessário ou quando eu assim desejar. Eu posso ter vida curta – muitas existências e formas diferentes de sentir em uma única vida. Mas quem quer exigir até conseguir modelar totalmente à sua maneira – vá procurar outra. Eu sou nova ainda, e estou farta. Pretendo mergulhar em silêncios. Sorrir apenas por prazer. Ser real e espontânea. Contida se eu quiser. Nada contida se eu preferir.

Liz Christine