quarta-feira, 9 de maio de 2007

Eu te exijo

Fumando palavras e ausências fumando abstinência saudade vontade
Fumando angústias recordações a noite que vem fumando estrelas que cantam
“Todos nós estamos na lama” – Oscar Wilde, O leque – “mas apenas alguns de nós estão olhando as estrelas.” O que estou olhando é um espelho eu vestindo um casaco apenas um casaco eu me olhando no espelho de cabelos úmidos e olhos irritados pela fumaça
Coração irritado pela ausência ausência de mim mesma se me estruja el corazon
Eu não estou em cada palavra que eu digo
Estou em cada silêncio distante que prolongo estou em cada brasa que cai na pia
Fumando vozes no banheiro fumando vozes de sonhos a voz do Louis Armstrong sorri para mim cantando “Ain’t nobody’s business if I do” what did I do what did I do
Pego a tesoura e corto uma mecha de cabelo gostaria de cortar minha língua e não poderia mais não poderia mais não poderia mais
Mas eu adoro
So lonely I wanna die Todos tão sozinhos nós estamos inseridos numa confusão de vozes que opinam sem ajudar e eu exijo eu exijo
Uma língua apenas uma língua que não me exija nada e que não me confunda e que não me ame porque amar é cercar de cuidados que estou despreparada para receber
Receber e retribuir receber e aproveitar receber e assoprar
Assoprar as feridas do amor não correspondido porque eu não correspondo ao comportamento esperado eu não correspondo à esperada delicadeza com os sentimentos e anseios alheios
Eu e a minha ansiedade e confusão de sentimentos e fumaça e ausência
Ausência de mim mesma no cotidiano e nas frases trocadas eu não tenho mais domínio do que respondo respondo qualquer coisa só para fugir
A verdade é essa: quero fugir
Fugir com uma língua por duas semanas para fumar todas as músicas que eu amo
Uma língua que não me ame que não me exija porque amar é também exigir e eu exijo eu exijo
Eu te exijo

Liz Christine

segunda-feira, 7 de maio de 2007

plantações de palavras


I just can’t put my poor self together… quero mel, velas, sorvete de pavê, sorvete de café e sorvete de brownie. Quero ela, você, e mais outra, e mais outra. Mais outra música. As músicas todas têm um rosto. Rostos que se repetem. Músicas têm cor, corpo, olhos, cabelos, perfumes, curvas, estatura. Eu me olho no espelho e nunca me reconheço. Quando me vejo semi-nua eu me amo tanto quanto um gato ronronando. Eu me espanto com o que eu fiz. Meu inconsciente escreve. Meu inconsciente lê pessoas. Meu inconsciente relê o passado. Não existe passado. Apenas sentimentos. Todos presentes, todos presente. Não existe nem passado nem futuro. Pessoas nascem a cada instante. Cada vez que se conhecem. “Nasci na noite em que te conheci, eu não tenho passado...” Uma frase do filme Gilda que nunca esqueço. Porque eu sinto assim. Mas faz tempo que não me sinto nascer de novo. Eu me sinto velha e desbotando de tantas lágrimas colhidas ao pé das orelhas repletas de piercings. As ovelhas estão cada vez mais irascíveis. Por que há pessoas vingativas nesse mundo tão repleto de verde e azul e vermelho e lilás e roxo e rosa? Não sou assim. Sou o ronronar de um gato. Eu quero prazer, quero nascer, quero ser um sorvete cremoso derretendo numa tarde fria e úmida de inverno. Quero uma língua incansável, uma mente artística, um corpo feminino e delicado. Quero a voz que me faz suspirar também, não precisa fazer nada, apenas falar. Não sei. Todos os assuntos, não sei. Eu nunca sei de nada, nem de mim mesma. Não sei mais o que eu penso a respeito de nada. Mas sei que as ovelhas estão irascíveis. E maldosas. Talvez seja impressão. As ovelhas não mexem mais na minha cabeça, nas minhas costas, na minha nuca, no meu cóccix. Elas mexiam em tudo, sabia? E amavam Billie Holiday, tanto quanto eu. Quero todas. Todas as músicas que me fizeram derramar lágrimas de saudades. Saudades de ronronar. Saudades de ser um sorvete cremoso derretendo numa tarde fria e úmida de inverno. Saudades de ser criança que ama brincar com suas bonequinhas de porcelana. Saudades de andar semi-nua por entre plantações de palavras. Saudades do verde nos meus lábios. Nunca mais eu vou fugir. Nunca mais eu vou mergulhar. Nunca mais eu vou calar a boca. Quero ir-me embora. Quero voltar ao verde. Quero seguir em frente com o amor que eu sinto crescer a cada amanhecer. Cada anoitecer. Amor pelas músicas que se reduzem a duas únicas imagens. Rostos que se repetem. Palavras que me envolvem. É assustador o meu problema. Meu problema se chama...

Liz Christine