quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Gosto de febre


Ela deixou um gosto de febre na minha boca. E quando as unhas dela deslizaram pelas minhas costas, eu pensei naquela música, aquela sobre a cor dos corpos que se desejam e se descobrem na escuridão. A escuridão da fala que ainda não encontrou a pergunta certa. A escuridão do tato que procura em outro corpo o próprio sentido. E como eu buscava, buscava em cada encontro o sentido pleno de uma verdade absoluta. Nunca existe a absoluta certeza. Ela perguntou tudo o que podia a meu respeito. Não questionei nada. Quando a mão dela subiu por debaixo da minha blusa e afastou meu sutião, eu me lembrei de outra música, alguma música sobre a provável impossibilidade de viver sem a nossa metade. E eu disse: vem comigo – e a levei para um canto ainda mais escuro. A música alta não interferia na minha memória musical – e era só disso que eu me recordava, músicas que já haviam tocado em alguma parte de mim. Não me lembrava de mais nada. Não havia mais nada… só o gosto de febre que fazia com que eu desenhasse sons e palavras dentro da escuridão de uma interseção que não vai se repetir. Mundos diferentes. Realidades divergentes também têm interseções.

“_ Você quer beijar-me, Ivich? – disse a rapariga lisonjeada.
_ Quero, vem. – E puxou-a pelo braço, autoritária.
(…) Finalmente tomara-lhe o rosto entre as mãos e a beijara na boca.”
A idade da razão, Sartre

Liz Christine

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