sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Como uma rosa despedaçada


“But it’s just no fun
When you hate the person you’ve become”
Roll on, Dntel

Não tomei nada hoje. Porque sinto um gosto amargo. Um gosto amargo de pesadelo. E pode-se perder tudo, menos a si mesmo – o que bate e o que cria. Onde se abrigam os sonhos ou o amor. E as memórias. Apago memórias de meu coração que bate no ritmo de um amor que me perdeu. E evito pensar as sombras de um coração partido pela idéia que não consigo alcançar. Não tenho jeito. Sou caso perdido. Mas não encerrado. Não me fecho em mim mesma a não ser quando – há um gosto amargo. Por isso não quis tomar nada. Para evitar. O veneno de meus pensamentos. A pureza de me encontrar ainda assim. Não sinto raiva mas me revolto e disparo tempestades em poucas palavras – poucas mas extensas. Eu quero a tranquilidade – a tranquilidade dos extremos do prazer saciados.

A tranquilidade do dia seguinte, ouvindo apenas música e tuas palavras doces. Sentir tuas mãos suaves me apertando contra ti num abraço macio. Mas algo me estraga. É a incerteza. A incerteza – aconteceu ou não? Tu me ama mesmo assim? Fica comigo depois disso? Eu me sinto inocente. Eu esqueci tudo. Não sei de nada. Sei pressentimentos, mas não tenho lembranças. Eu estava lá, tu estava lá, e não sei em quê pensávamos. Sinto uma conexão entre as pessoas em certos momentos. Mas em momentos de sobriedade só há conexão entre os que se amam. Ou as que se amam. Como nos filmes, em alguns filmes, tu salvou minha vida – e eu já te amava antes disso.

Sinto o passado no presente. Ou sinto presente meu passado. Quando vejo uma fotografia tua eu revejo tudo. E não entendo nada. Tu preencheu vários dos meus lados porque tu foi muitas – e é a única que eu gostaria de ter de volta. Então eu revejo aquele instante e o instante que se seguiu àquele momento – e só vejo a ti. Mas quando fico insone aquele pesadelo antigo me vêm em imagens. Imagens vagas nunca nítidas. Mas não me odeio, não por isso, nem por nada. Apenas me sinto decepcionada por ter te perdido. Como se o erro fosse exclusivamente meu – “e foi, exclusivamente seu”, tu poderia me dizer caso ainda falasse comigo. Mas não reconheço, não reconheço esse erro – entenda uma coisa que tu nunca compreendeu: eu não tinha a experiência que tu pensava ver em mim. Eu sabia tanto quanto você.

Quanto tu me deixou passei uns tempos entre copos e comprimidos e alguns canudos. Em banheiras de água quente e camas de amigas que não eram tão amigas. Tudo passou. Hoje não tomei nada. Mas meu amor por ti não passa. E a memória daquela manhã em que acordei no hospital se confunde em minha cabeça – isso foi muito antes do nosso relacionamento amadurecer. Mas foi do que você me acusou quando se cansou. Tu sempre parecia dizer em todos os teus gestos que eu não te amava tanto quanto você me amava. Mas você se enganou, pelo menos nisso – o resto sobre mim tu pareceu adivinhar, ler na minha pele ao beijar minhas mãos. Você adivinhava meus desejos e se adiantava a eles. Via minhas fantasias entre frases caídas durante minhas distrações – e me surpreendia porque eu mesma ignorava minhas fantasias. E assim tu me teve mais do que qualquer pessoa – e me deixou, falando de assuntos mortos para mim. Eu morro mais sem ti do que podia ter morrido aquela manhã. E se tu algum dia me quissesse de volta? Eu teria forças para mergulhar? Acreditaria de novo em ti mais do que em qualquer outra coisa? Só sei que me sinto despedaçada. Como uma rosa que serviu de brinquedo às dúvidas de alguém.

Liz Christine

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