sábado, 4 de dezembro de 2021

As gardênias (e as rosas e os lilases)

 


Naquela época, o passado se encontrava logo ali, quase presente

 

E antes nem havia passado, tudo era presente, e tão presente

 

E ainda antes nem presente havia, nem o antes do presente

 

Só o porvir e o durante e o porvir

 

E agora um poema para Maio e um poema para Novembro

 

E a prosa poética para Dezembro ou para Setembro ou para Outubro

 

E a visão simultânea e os poemas embaralhados

 

E a trança e a gata persa ou siamesa

 

E o gato laranja e sonhos entrelaçados

 

E nada que possa ser pronunciado sem reservas

 

Ou quase tudo é mais ou menos possível ou ilegível

 

Traduzir silêncios   Traduzir miados

 

Não traduzir os sonhos e colher gardênias

 

De novo elas, as gardênias

 

E as rosas e os lilases.

 

(A coruja me contou que já não compreendia os humanos e me perguntou se eu discordava. A coruja dançou e disse que as palavras eram desnecessárias. A coruja veio me fazer companhia e ela era o meu presente tanto quanto os livros de poesias que o meu doce sonho trazia de presente de vez em quando.)

 

Liz Christine

quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

O gato das horas

 


O gato do tempo e o gato das horas. O camaleão olha a lua (chegando) que nada olha pois está ouvindo os próprios pensamentos e (lembrando de) poesias que derretem as muitas e eternas (dúvidas). As duas gatas aparentemente quase gêmeas vêm de linhagens diversas. Uma nasceu do culto à lua e a outra vive no planeta conhecido como Terra em um apartamento normal com suas tutoras. A que nasceu do culto à lua aparentemente vive igualmente em um apartamento com suas tutoras mas na realidade em essência vive (basicamente) em outro planeta criado por sonhos que não sabemos se existe ou não (mas ela vive lá).

 

As duas gatas aparentemente gêmeas são adultas e recolhem o tempo e as gardênias. E também guardam os livros que o gato do tempo lê e relê.

 

Liz Christine

quarta-feira, 3 de novembro de 2021

Esmeralda

 


Bela Adormecida acordou e voltou a dormir. Ela preferia ainda sonhar com a fada que se chamava Esmeralda. Bela Adormecida era poetisa e também nefelibata. A fada Esmeralda era um sonho recorrente, antes mais realidade que memória e agora mais memória idealizada que realidade. Bela Adormecida não reconhecia mais a realidade e continuava sonhando e sonhando. Dormia, acordava e dormia. Tomava banhos longos e aquecidos e voltava a dormir. Bebia café e voltava a dormir. Lia e brincava com os gatos e bichos e voltava a dormir. E dormia sempre e muito. E quando estava acordada não sabíamos se estava acordada ou dormindo. Às vezes falava pouco. Às vezes falava demais. De qualquer forma, falando pouco ou muito, não sei se as palavras eram plenamente compreendidas ou levemente distorcidas. Bela Adormecida queria continuar dormindo porque só em sonhos via a fada Esmeralda. Então era essa a real realidade. Mas a fada Esmeralda realmente existia. Eu a vi comprando tabaco ontem. Falei muito vagamente com ela e me retirei. Os diálogos confusos são difíceis de se transcrever. Pensei em escrever um poema. Mas prefiro deixar que as reticências me expliquem o real significado (...).

 

Liz Christine