sábado, 10 de novembro de 2012

Presente irretocável




O anel de noivado dentro da caixa – armários trancados. A gata se vê no espelho do banheiro – silêncio impregnado de suaves recordações. Recordações presentes – um presente tão límpido quanto águas perfumadas com interseções poéticas (...).

Pedaços de camembert – porções de rolinho primavera de legumes. Xícaras de café – babuskas misturando ideais desconexos com favos de mel. Mastigar os favos – camuflar ideais desconexos. A suave conexão com a realidade se distrai um pouco durante os mergulhos absolutos em águas perfumadas com interseções poéticas.

A realidade ultrapassa os sonhos – a realidade chega aos poucos através de frestas imprevisíveis. A realidade chega aos poucos trazendo recados imprevistos e soluções de pelúcia. Ovelhas cantarolantes – banhos de imersão.

Imersão em silêncios distraídos – babuskas escovando a gata que se vê no espelho. Ela ronrona mansamente – e a conexão entre as babuskas se entrelaça docemente ao sabor das interseções perfumadas. Uma letra de música de Walter Franco – um balé clássico – uma música reconfortante da Nina Simone – um mergulho profundo – um banho de imersão – um beijo trocado em frente ao espelho do banheiro – um abraço na xícara de café. E as babuskas sorriem distraidamente. Tão distraídas quanto as nuvens no chão do corredor que liga todos os quartos ao imprevisível esconderijo das meditações tão límpidas quanto o presente irretocável (...).

Liz Christine

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Indecisões




A eterna indecisão se acomoda por inteiro – asas degustando desejos irreconhecíveis... Irreconhecível é o aclamado transtorno abstraído – transtornos superados desenhando de novo um suave retorno ao miado exótico da gata escorregadia... Exótico – questão de ponto de vista. Escorregadia – questão de possibilidades. Escolher – escolha a impossível privacidade roubada pelas janelas com tela. Roubaram as cortinas – e um pequeno defeito na persiana impede a gata de fechar completamente as janelas com tela.

Transtorno alimentar – transtorno de duplas personalidades ou múltiplas preferências diferenciadas. Diferenciais – asas degustando as exceções tão irreais quanto a borboleta tatuada que enfeita os sonhos desorganizados do espelho irretocável.

Retoque as cores do desenho – tentando sem resultados.

Tentando esquecer – sem resultados.

Tentando transparecer – traduções equivocadas.

Superando equívocos – abstraindo transtornos de dupla personalidade ou peso.

A tristeza pesa sempre – sempre tentando esquecer o peso da tristeza.

A leveza dos sonhos perfeitos – leveza inalcançável (tão irreal quanto o ronronar da gata volúvel e ao mesmo tempo eternamente obcecada)...

Tudo tão irreal quanto a realidade fugitiva das cores do desenho – tudo tão concreto quanto os miados recortados na madrugada. Fallait pas ecraser la queue du chat – não corte muito as unhas da gata. Questão de ponto de vista – divergências necessárias ao bom funcionamento do equilíbrio que foge a todo instante...

A eterna indecisão se espalha por inteiro – tão irreal quanto poemas reciclados. Tão irreal quanto a realidade – tão irreal quanto o perfume saboreado toda vez que

Toda a vez que o vento me traz notícias da realidade tão irreal quanto eu mesma – mergulhando em cachoeiras intocadas e afastadas da poluição extrema que é

A poluição extrema que é o acaso – nada é acaso. Desenhando frases longas – desenhando silêncios feitos de contradições. A sede das cachoeiras – a sede das babuskas. As babuskas lésbicas sentadas no chão do quarto. As cachoeiras distantes guardando palavras irretocáveis. Erros. Abstrações. Sonhos concretos. Fantasias impossíveis. Desenhando frases curtas em cada miado tão irreal quanto o acaso. Desenhando contradições invisíveis e tão irreais quanto o silêncio preenchido por paixões sem nexo. Nada tem nexo – nada tem solução. Tudo tem sentido – tudo passa exceto as obsessões volúveis da gata insone. Volúvel é questão de ponto de vista. Real ou irreal também.

A sede das babuskas enamoradas entre si – o ronronar do gato sorrateiro que espia através de fechaduras ou portas trancadas. Tranque todas as portas – esconda-se até que os sonhos mais doces se tornem plausíveis e tão reais quanto o cappuccino que acompanha as eternas indecisões amistosas.

Liz Christine

domingo, 4 de novembro de 2012

Laisse le temps




Peixes nadando alegremente em águas doces. Gatas observando tranquilamente as rosas falantes. Uma breve pausa no diálogo das rosas falantes. E o dia amanhece chuvoso. As camélias beijam a babuska de vestido vermelho que procura a outra babuska de longos cabelos negros e franja curta. O gato Lensky folheia um livro enquanto seu cappuccino esfria às seis e meia da tarde – e o tempo transcorre suavemente dentro do quarto onde vivem as duas babuskas com suas gatas cautelosamente curiosas.

Uma babuska é escritora, a outra é jornalista e trabalha com produção de eventos – e o gato Lensky fecha o livro e bebe o cappuccino ouvindo pedaços de conversas ao seu redor.

O tempo transcorre suavemente – sábado à meia-noite os peixes continuam nadando alegremente em águas doces. A cafeteria fechou há meia hora atrás. E as rosas falantes ficam em silêncio por alguns instantes enquanto ouvem atentamente a música Blueberry hill. Uma das camélias é psicóloga e dorme cedo todas as noites – ela sonha com filmes sem palavras, imagens sem diálogos, cenas soltas e ligeiramente indefinidas que se fundem com memórias alternadas de tudo que foi ouvido durante o dia.

A temperatura cai de madrugada – e a tranquilidade das estrelas ameniza os humores temperamentais da lua sempre distante das reais inclinações do mar.

Liz Christine